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Maradona renasceu em Nápoles: encontro do jogador com cidade fez dele um mito planetário



A história de amor entre Nápoles e Diego Armando Maradona, uma das mais arrebatadoras do futebol, foi crucial para a mitologia do argentino dentro e fora dos gramados, afirma o antropólogo e escritor napolitano Marino Niola, 77 anos, um estudioso do universo maradoniano na maior cidade do Sul da Itália.

Para Nápoles também se tratou de um novo começo: impactada por um terremoto que a atingiu em 1980, ela entrou definitivamente no mapa do futebol graças ao “pibe” nascido em Villa Fiorito, favela nos arredores da capital argentina. Niola foi um dos organizadores de uma cerimônia laica realizada em 1991 após Maradona deixar o Napoli ao ser flagrado com cocaína num exame antidoping. Foram quase sete anos na equipe.

A homenagem, que reuniu cerca de 1.500 pessoas no Castelo Nuovo, um dos pontos turísticos de Nápoles, foi intitulado de “Te Diegum”, referência ao “te deum”, hino da liturgia católica em que os fiéis agradecem a Deus.

Cidade historicamente considerada “estrangeira” pelos próprios italianos, Nápoles se formou influenciada por diversas culturas estrangeiras, como a árabe, a espanhola e a francesa, e desenvolveu um ambiente tipicamente “latino-americano”. Isso se reflete ainda hoje na economia napolitana, formal e informal. Região menos desenvolvida do que o Norte industrializado, o Sul italiano ainda é estigmatizado por causa das máfias, que nasceram e se expandiram para o mundo a partir dali.

Quando Maradona decidiu vestir a camisa do Napoli, ele sabia – ainda que superficialmente – o que iria encontrar pela frente. O Napoli enviou emissários para Barcelona. Giuliano, um dos diretores daquela época, que tinha sido jogador no meu tempo, foi explicar para ele o que era o clube e a cidade - afirma o brasileiro Jarbas Faustino, conhecido como Cané, que fez história no Napoli – primeiro como atacante, contratado em 1962 do Olaria, depois como treinador. Cané, 81, vive na cidade há 58 anos.

Um dos companheiros de ataque do brasileiro no Napoli na década de 1960 foi o argentino Omar Sivori, também conhecido pelas polêmicas fora de campo. Sivori era uma das poucas referências de Maradona sobre o clube fundado em 1926 e que até sua chegada não tinha conquistado nenhum título da elite.

O que mais orgulha os napolitanos, e que foi muito lembrado nos últimos dias, é a escolha de Maradona por time pequeno de uma cidade marginalizada em detrimento dos grandes do futebol italiano, como Juventus, Milan ou Inter de Milão, todos baseados no Norte.

Na apresentação em 1984, no Estádio San Paolo, cerca de 80 mil torcedores pagaram ingresso por um valor simbólico para ver a apresentação.

Nos sete anos em que vestiu a camisa do Napoli, Maradona viveu a glória e também desceu ao inferno. Comparado a São Januário, o santo patrono de Nápoles, ele não conseguia sair de casa durante o dia por causa do assédio. São conhecidas entre os moradores as suas escapadas noturnas, muitas vezes saindo com amigos de moto.

Na cidade também se evidenciou o consumo de cocaína e a relação com mafiosos ligados à Camorra, organização criminosa originária de Nápoles. Marino Niola diz que era “inevitável” e “natural” o encontro entre Maradona e os mafiosos da Camorra, pois havia uma “atração antropológica” entre eles.

No luto provocado pela morte do “napolitano” por excelência, o que mais se ouviu nas ruas eram declarações de que Maradona era “um de nós”. Tradição em Nápoles, os cartazes de aviso fúnebre anunciavam que “Diego é nosso filho e irmão mais amado”.



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